sábado, 25 de junho de 2011

Reprodução prolongamentos críticos?


REPRODUÇÃO OU PROLONGAMENTOS CRÍTICOS?[1]

O autor Bernard Lahire relata em seu texto que Pierre Bourdieu representa um grande teórico no mundo da comunidade científica. Até mesmo pelas suas idéias complexas e ao mesmo tempo estimulantes. Para que suas teorias fiquem vivas, Lahire destaca que existem duas formas para mantê-las: uma delas é aplicá-las a novos campos de esforço intelectual;  e a segunda é de apenas repassar sem ao menos questioná-la; que no caso muitos o fazem são meros repetidores, ou seja, somente copiam de forma a não trazerem nada de novo.
Quando se trata de Bourdieu os sociólogos vão ao extremo, idolatram a obra dele,  de forma a não questioná-la virando apenas meros repetidores impossibilitando assim um real debate cientifico. Para que haja sim novas maneiras de expor a obra de Bourdieu é necessário que não fiquem no extremo de um lado os que idolatram a obra e do outro os que querem tirar proveito criticando sem ao menos saber o que é realmente sua obra para ficarem sendo “respeitado” e conhecido por criticar Bourdieu.  
Lahire faz críticas sobre estes pontos de vista quando cita sobre “a sociedade de Boudieu”, uma espécie de suicídio coletivo devido a falta de coerência de reproduzir ou criticar por criticar. Uma reflexão muito interessante sobre o habitus e o capital social característico que no decorrer será mais aprofundado. Para também entender sobre que gostar do autor não precisar ficar paralisado em sua teoria sem ao menos analisar profundamente o que o mesmo quer dizer ou o que de novo poderá ser contribuído para o estudo. Pois o pensamento científico só será mantido vivo se submetido constantemente a discussões. Na França, como Lahire descreve,  ficam congelados pois há muito pouco sobre argumentações dos sociólogos e contra-argumentação dos mesmos.

Pierre Bourdieu costumava expressar sua tristeza por ter ganhado no decorrer de sua carreira “inimigos” que o “atacavam” e poucos “adversários” verdadeiros que teriam realizado o trabalho necessário para lhe opor uma “impugnação”, o que é ao mesmo tempo verdadeiro e falso. É como grande parte dos pesquisadores em ciências sociais, ele se recusava a reconhecer esses adversários reduzindo-os a inimigos mal-intencionados. Assim, por causa de inúmeras críticas recebidas em sua obra, levou a pensar que outros pesquisadores não estavam a sua altura.
Além disso, quando uma crítica é formulada a respeito de uma obra não só reconhecida cientificamente, mas também conhecida muito além dos círculos de especialistas, a situação se complica. E, um modo de desqualificar o trabalho crítico consiste em quando alguém deseja “fazer seu nome por meio de uma polêmica como um autor famoso.”

Bernard Lahire relata que a crítica cientifica pode e deve exercer-se, se, e apenas se, houver argumentos (lógicos ou empíricos) para criticar. E tal concepção, no nosso entender, se faz coerente. Como toda produção tem suas intenções, vale lembrar que é muito “deselegante” da parte de um indivíduo fazer uma crítica a um terceiro, sem que tenha base ou fundamentos. E, não há como deixar de destacar que, existem “autores” que possuem obras de “linhas e pensamentos” diferentes. Desta maneira confunde-se então, crítica em disputa, tentativa de destruição e ou calúnia ao seu próximo.

Em suma, para o nosso processo de ensino-aprendizado, compreende-se que, precisamos ter uma consciência crítica dentro do campo, ter atitude para buscar novos conhecimentos, pensar, amadurecer na construção crítica e não devemos parar no tempo e sim construir novos “Habitus”.

A seguir destacamos alguns prolongamentos críticos da obra de Bourdieu, apontados no texto de Lahire. Estes prolongamentos criticos remetem a atitude que deve ser tomada em relação a pesquisa e levam em consideração dois dos principais conceitos de Bourdiu, a saber, habitus e campo.

Prolongamento I : A atitude diante do trabalho intelectual

A leitura obra de Pierre Bourdieu pode provocar uma série de atitudes que se manifestam constantemente em seus textos. Todas elas marcam a relação com o trabalho intelectual de um homem oriundo de um meio familiar social e geograficamente dominado, mas atitudes que, longe de serem redutíveis as suas origens, poderiam constituir uma ética da profissão de sociólogo:
1) sua insistência a respeito da relação pratica com a teoria, que o sociólogo deve manter. Toda ação pratica deve ter base teórica.
2) sua evocação permanente de uma ascese do trabalho cientifico da seriedade e do rigor na construção do objeto e da pesquisa.

Prolongamento crítico II: O habitus

Bourdieu relata o habitus no sentido de costume, raiz, experiência vivenciada no cotidiano da pessoa. Ou seja, é a bagagem de conhecimento e experiência que o indivíduo traz ao longo de sua vida. Um agricultor, por exemplo, mesmo não sendo alfabetizado entende muito de plantio e cuidados com a terra do que um pedreiro profissional, porque o habitus do agricultor esta marcado com o conhecimento habitual nas relações vivenciadas, na terra.

 O hábitus é um papel fundamental, pois surge em meios ao conceito inovador e apresenta um produto da história e interação do indivíduo. Segundo Bourdieu, o “hábitus” influencia de várias formas na vida do indivíduo tanto nos gostos no estilo de vida, na maneira de como as coisas são realizadas, enfim , na própria ação  do ser humano.

O habitus trabalha com as probabilidades e possibilidades de ação, é inconsciente e se expressa através de diversas formas, seja no estilo de vida, nos gostos, nas maneiras de fazer as coisas, ou seja, está na ação humana. Na verdade, ele abrange uma multiplicidade de relações e dentre elas a relação com a prática social. Bourdieu procura rejeitar as teorias que adotam a prática social como uma relação mecânica, a prática não pode ser reduzida a esquemas previamente estabelecidos e fixos. (Pies 1998, p.5)







Prolongamento crítico III: O campo

Elementos fundamentais da definições do campo segundo Bourdieu:
- Um campo é um microcosmo incluído no macrocosmo constituído pelo espaço social (nacional ) global.
- Cada campo possui regras do jogo e desafios específicos, irredutíveis as regras do jogo ou aos desafios dos outros campos.
- Um campo é um “sistema” ou um “espaço” estruturado de posições.
- Esse espaço é um espaço de lutas entre os diferentes agentes que ocupam diversas posições.
- As lutas dão se em torno da apropriação de um capital especifico do campo (o monopólio do capital especifico legitimo) e ou da redefinição daquele capital.
- O capital é desigualmente distribuído dentro do campo e existe, portanto, dominantes e dominados.
- A distribuição desigual do capital determina a estrutura do campo.
- Os interesses sociais são sempre específicos de cada campo e não se reduzem ao interesse de tipo econômico.
- A cada campo corresponde um habitus próprio do campo. Apenas quem tiver incorporado o habitus próprio do campo tem condição de jogar o jogo e de acreditar na importância desse jogo.
- Cada agente do campo é caracterizado por sua trajetória social, seu habitus e sua posição no campo.
- Um campo possui uma autonomia relativa: as lutas que nele ocorrem tem uma lógica interna, mas o seu resultado nas lutas (econômicas, sociais, políticas) externas ao campo pesa fortemente sobre a questão das relações de força internas.
Segundo o autor grande parte dos indivíduos de nossas sociedades, como as classes populares que, de saída, são excluídas dos campos de poder. Revela-se fora de campo, afundados num vasto “espaço social” cujo único eixo de estruturação é o volume e a estrutura do capital possuído, o capital cultural e capital econômico.

Para Boudieu a compreensão da obra de um autor famoso levanta problemas particulares quando comparada à compreensão de uma entrevista com um “leigo”, e isso “mais particularmente em razão de seu autor pertencer a um campo”(1992, p.418) Consequentemente a teoria dos campos constitui uma maneira de responder a uma serie de problemas científicos, mas por sua vez, pode constituir um obstáculo ao conhecimento do mundo social.

O autor conclui que o verdadeiro respeito cientifico para com uma obra e seu autor consiste na discussão e na avaliação rigorosas e não na repetição sem fim dos conceitos, tiques de linguagem, estilo de escrita, raciocínios preestabelecidos etc. É preciso saber acordar alguns usos adormecidos desses conceitos, é preciso ousar levantar certas questões, autorizar-se a contradizer, refutar, complementar, matizar o pensamento de um autor. Nem rejeição brutal nem repetição de epígono, mas dívidas e críticas.. 

Em suma, para o nosso processo de ensino-aprendizado, compreende-se que, precisamos ter uma consciência crítica dentro do campo, ter atitude para buscar novos conhecimentos, pensar, amadurecer na construção crítica e não devemos parar no tempo e sim construir novos “Habitus”.




[1] Anotações do 3o encontro de 2011, do grupo de estudo Epistemologia e Educação. Conteúdo baseado em LAHIRE, B. Reprodução ou prolongamentos críticos? Educacaçao e Sociedade, v. 23, n. 78, p. 37-55. Campinas, abr. 2002.

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